Caro Diogneto - 28


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Affresco, 1531-1532 d.C.
Affresco, 1531-1532 d.C.

JESUS, Abril 2011
de ENZO BIANCHI
Estamos perante uma Igreja cansada, ou melhor, usando uma expressão do magistério Papal,  uma “ecclesia afflicta

JESUS, Abril 2011

UMA IGREJA CANSADA, “AFFLICTA”

Não se pode negar: muitos elementos da Igreja dizem-se cansados, não esperam mais. Muitos presbíteros e religiosos lamentam-se, muitos fiéis, cada vez mais, distanciam-se das formas visíveis de pertença à Igreja. Sabemo-lo também pelos Bispos: na Alemanha, na Áustria, na França e na Bélgica não são poucos aqueles que, de forma audível, deixam a Igreja, que pretendem apagar o seu nome da lista de paroquianos ou do registo de baptismos. Em Itália, com menos clamor, sem as contestações conhecidas nos anos setenta (século XX), regista-se o fenómeno daqueles que continuam a viver a sua fé “etsi ecclesia non daretur”, “como se a Igreja não existisse”.

Sim, estamos perante uma Igreja cansada, ou melhor, usando uma expressão do magistério Papal, uma “ecclesia afflicta”. Muitas vezes, nestes tempos, leio e releio São Basílio, o grande Padre da Igreja que no “De iudicio Dei” procurava compreender a situação eclesial do seu tempo: os seus juízos, os seus sofrimentos são muito semelhantes àqueles que eu sinto, na oração, no confronto com os homens e as mulheres que encontro. Não é um tempo fácil para a Igreja, porque ela se encontra ferida, dividida: nela muitos "se mordem", como escreveu Bento XVI, transformando cada diversidade, mesmo que legítima em conflito feroz, em condenação, em censura ou mesmo em intervenções obsessivas que fazem a caricatura do outro - que permanece sempre como um irmão/ irmã pelo qual Cristo morreu, um membro da Igreja católica - até ao desprezo e à desligitimização... na época cultural em que o sentido de pertença é muito ténue, ocorre estar atento e talvez mesmo reagir a este sinal que pode abrir um "cisma mudo", que não enfraquece apenas a Igreja, mas redu-la a um "movimento", como analisou com inteligência, recentemente, o secretário da CEI, mons. Crociata.

Mas de onde vem este cansaço? Existem causas visíveis? A diminutio da comunidade cristã em termos de membros e em particular de vocações à vida presbiterial e religiosa - pelo menos no Ocidente em que se situa a Itália, porque é sobre esta relidade que fazemos a análise – mesmo se não ameaça as convicções, torna mais difícil a vida eclesial e sobretudo cansa os presbíteros - cada vez mais sobrecarregados de serviços e trabalhos, com uma idade média cada vez mais alta - e expõe a vida religiosa à tentação de não esperar mais de si mesma. Não esqueço o clima cultural em que vivemos, ou melhor, para o qual somos empurrados, cada vez mais marcado por valores que são o oposto dos valores cristãos: o esvanecimento dos princípios éticos, o desaparecimento do horizonte comunitário, o individualismo crescente, o niilismo, a egolatria, a ditadura das emoções e dos sentimentos, a incapacidade de preserverança, a perda do sentido de fidelidade. Conhecemos todos muito bem e de memória este elenco que diz muito da realidade em que vivemos, do ar que actualmente se respira.

Creio, no entanto, e convém reconhecer que há aspectos da vida interna da Igreja que contribuem para nos cansarmos. Quando penso no esforço feito pela minha geração, em obediência à Igreja, por um renovamento através do Concílio e vejo que hoje, muitos na Igreja, trabalham contra o Vaticano II, criticando-o e distanciando-se dele, contra o Ecumenismo e contra a Reforma Litúrgica, verifico que, para muitos, é evidente um sentimento de confusão. Alguns dizem, com muito respeito: “Não percebo nada!”, outros acabam por sofrer até à frustração…

Tanto cansaço para mudar, decorridos já quase cinquenta anos – um esforço feito com muito entusiasmo mas também com custos de sofrimento e submetendo as nossas nostalgias pessoais ao bem da vida eclesial – segundo as indicações do Concílio e do Papa: e hoje? Porque existem na Igreja vozes com o Papa contra os Bispos e com os Bispos contra o Papa, quando se trata de celebrar a eucaristia, lugar por excelência da comunhão eclesial? Diz-se que o caminho ecuménico é irreversível, mas depois vemos que muitos querem corrigir o seu entendimento feito a partir do Vaticano II. Papa e Bispos ensinaram-nos que o verdadeiro Ecumenismo não significava retorno à Igreja Católica, mas antes caminho para a Unidade que os católicos confessam ser um princípio, já presente na sua Igreja, mas que deve ser ainda completado, mais do que nunca, nas diversas formas e convergências. Teremos tido, talvez, Bispos e Papas como "maus professores"? E os "gestos", eloquentes, cumpridos pelos últimos Papas foram imprudentes, fábulas para não levar a sério? 

Tenho quase setenta anos, trabalhei toda a minha vida para a Unidade das Igrejas e para a comunhão na minha Igreja, mas hoje sinto e constato tantas contradições. Sim, estou cansado, também eu, destas guerras entre facções eclesiais combatidas em blog's por meio de jornalistas complacentes; estou cansado de acusações que mostram como não se quer nem escutar, nem conhecer a verdade, mas apenas fazer calar o outro. E pergunto-me, como muitos outros: para onde vai a Igreja? esta nossa Igreja que amámos tanto e que queremos continuar a amar, como membros leais, não aduladores e que não procura nem previlégios, nem promoções...esta Igreja que amamos, mais do que a nós mesmos!

ENZO BIANCHI